Sandrinha, 16 anos, matou-se enforcada.
Ivanete, 16 anos, matou-se, cortando os pulsos.
Leonice, 19 anos, após cinco anos de prostituição, “amigou-se”
com o camioneiro, e enforcou-se quando descobriu que estava grávida e o
parceiro não confiou na sua palavra.
Eram minhas amigas e até hoje, quanto lembro delas, eu
fico com a impressão de que sou a única pessoa que lembra de suas existências.
Todas tiveram uma única motivação para buscar a morte
como um fim para o seu sofrimento: amar um homem e dele engravidar.
O namorado da Sandrinha, arremedo de homem, fugiu para
São Paulo quando recebeu a notícia da gravidez. Era órfã dos pais, morava com a
avó, bastante idosa, e cuidava de um irmão menor.
Ivanete era uma menina criada no meio de uma ninhada de
irmãos falastrões, temidos como violentos. Engravidou, o namorado deu no pé e,
o medo de enfrentar os irmãos e o pai, a levou ao suicídio.
Leonice, sozinha no mundo desde a mais tenra infância.
Sofreu todo tipo de abuso, tornou-se “biscate” como se dizia na época até ir
morar com um dos seus clientes. Quando ela engravidou, ele a desprezou. Brigaram
e ele foi viajar. Dias depois, os vizinhos sentiram o cheiro forte e chamaram a
polícia. Havia quatro dias que ela estava dependurada na ponta de uma corda.
E me perguntam se sou a favor do aborto?
Acho que nenhum homem está preparado para tomar posição
nesta questão. Porque nós, na maioria absoluta das vezes, somos os causadores
desse tipo de tragédia, porque somos covardes, inumanos e cruéis com as
mulheres. Seduzimos, usamos e fugimos.
Ontem fez 43 anos que Sandrinha foi encontrada morta,
pendurada numa tira de pano de lençol. Prestes a completar 16 anos, eu ajudei segurar
seu corpo quando o policial cortou a tira. E até hoje não consigo segurar as lágrimas
quando sua imagem me vem à memória, seu rosto infantil e seu sorriso inocente.
Talvez, se elas tivessem tido o direito de abortar, elas
estariam aqui, teriam construído uma família; teriam tido uma segunda chance.
Os calhordas vagabundos que as engravidaram fugiram
dentro do anonimato. A pergunta que eu me faço é: será que eles conseguiram
dormir e tocar a sua vida como se nada tivesse acontecido?
O título eu roubei de um filme de 1970, Skullduggery,
com Burt Reynolds e direção de Gordon Douglas, baseado no romance de Les
Animaux Dénaturés, de Jean Bruller.
Crueldade também retratada na linguagem dura extraída das penas do autor. Tantos crimes, tantos abusos, tantos silêncios e tantas conivencias femininas, inclusive.
ResponderExcluirQ história triste Lê, é para se refletir
ResponderExcluirTriste história, mas uma realidade!😢
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