terça-feira, 28 de agosto de 2012

LIVRO DOS DESATENDÍVEIS - CAPÍTULO 4





A minha vida não é minha. 
Nada de mim pertence a mim; nem eu sou eu.
Ajoelho sobre pedras pontiagudas pra sentir-me vivo.
Caridade! Afasta-te de mim, vil mulher de olhos súplices.
Rio-me de ti, rio-me de coisas caridosas e enfadonhas.
Insta minha alma ao debruçar do abismo sem fim.
Solto meu cachorro de sete cabeças sobre os santos -
Tortuosos gessos de coloridos falsos sobre os altares.
Inebriado, colérico e desdentado mordo com gengivas secas
Nacos das carnes podres onde vicejam os vermes da memória.
Ave cruz! Viver me cansa, morrer é algo bem-vindo.
Viver me atormenta, dá náuseas nesta manhã.
Arde em mim este fogo pálido de morto.
Não mais sonho teus beijos nem teus gozos.
Incho sob a campa na rasa cova onde me tornei pasto de vermes.

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