sexta-feira, 21 de novembro de 2014

RIO PRETO D - UM DIA DAQUELES

Publicado no Jornal D Hoje Interior em 21/11/2014




Todo mundo tem aqueles dias em que nada parece dar certo. É o dia de Murphy de cada um. Os meus costumam ser às quintas-feiras. Mas, às vezes, dá uma variada. Então é na segunda, na terça, na quarta ou na sexta. Dificilmente é no sábado ou no domingo. Então, aquele dia sempre cai na semana. E você diz de boca cheia: pô... hoje eu não devia ter levantado da cama. O problema é que se você não se levantar da cama não poderá saber se está vivendo um daqueles dias!

Começa ao se levantar. Um estalo dolorido na coluna te lembra que os anos estão pesando na cacunda. O pescoço enrijecido é uma denúncia grave do corpo de que está faltando aquela meia hora de exercício. E cadê o maldito chinelo que escorregou para debaixo da cama... No banheiro, você esquece de verificar se tem papel higiênico. Não tem e todo mundo ainda dormindo e a ducha do vaso está enguiçada. Um torniquete quase cardíaco lhe aperta o peito, comprimindo por dentro a caixa torácica. Você acha que é enfarte chegando, mas o que chega é uma tremenda e sonora flatulência que estremece a casa toda e acorda a vizinhança!

E quando você sai na rua, depois, de terno e gravata, dirigindo aquele belo carro que fez por merecer, a mulher do vizinho olha pra você com aquele olhar 44 de quem diz, com certo cinismo: eu ouvi o que você fez agora de manhã cedo! Claro que você faz de conta que não é contigo ou que o olhar é de inveja do seu sedan último modelo. De repente o motor pifa, ali na calçada, com o portão eletrônico descendo. Você procura o dito cujo do controle remoto e ele escapa dos seus dedos que tremem de vergonha da vizinha que agora te olha com um misto de intriga e ironia. E você sente o baque do portão sobre o teto do carro. O estrago já está feito.

No serviço as coisas pioram. A chefe está mal humorada, também está naqueles dias. A internet está chegando de carroça. Acaba a bateria do celular logo na primeira ligação daquele cliente chato. Todo cuidado é pouco no banheiro, você verifica o papel, mas termina pingando na calça. Sua calça clara de sarja. Não dá para esconder os pingos, bem na frente, como porta-bandeiras. Você tenta disfarçar, põe e tira a mão, caminha de ladinho, mas nada desvia os olhares furtivos dos colegas e das colegas e os risinhos se pronunciam nos cantos dos lábios. Eta povo fdp! você pensa. 

E o dia não passa. Não bastasse, cai café na camisa alva, imaculadamente branca. Pra piorar, no almoço servem espagueti ao sugo e... por mais que você se policie o molho dá um jeito de escorregar e pingar. A camisa que era branca vira uniforme flamenguista.

Chegar em casa vira um sonho na tarde lenta e demorada. O sol não descamba. Pra piorar, uma sensação geral de mal estar toma conta do seu corpo. Resfriado, gripe, constipado, dengue, pressão baixa. Virose, diz o Carlinho da Farmácia. Só ele. E dá-lhe ASS, Aspirina, Dipirona, Luftal, salnãosabeoquecilicio...

Sua casa é o paraíso, é o Parnasso, o Éden, a Pasárgada, o lugar onde Deus pôs a mão para você descansar e recuperar as forças para o dia seguinte que virá. Porque você sabe que na manhã seguinte tudo vai recomeçar. E você será leão, ora será gazela e terá que correr, correr muito, cumprindo o velho ditado caipira de que se correr o bicho pega e ficar o bicho come. 

E por mais que nos advirtam, de uma coisa temos certeza: não existe receita contra aqueles dias.

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