terça-feira, 9 de dezembro de 2014

RIO PRETO D - SABOR DE GABIROBA

Publicado no Jornal D HOJE em 09/12/14






Dia da Imaculada Nossa Senhora da Conceição. É feriado municipal em Rio Preto. Dia de branco, como diriam os folgados; dia de ver Deus, como falariam os caipiras da época de mocidade do meu pai, na colônia da Fazenda Himalaia, ali em Bálsamo. Tempos idos. 

A família do meu avô paterno morava na Fazenda Himalaia e a do meu avô materno na Fazenda Brasil. Uma baixada separava as duas colônias. Ruim de geografia, acredito que o córrego do Bálsamo dividia as duas fazendas. Os mais intelectualizados diriam que este feriado é dia de roupas domingueiras, quando as meninas, todas fagueiras, se vestem melhor, com seus vestidos mais bonitos e se fazem mais belas... Mas isso, meus caros leitores, eram os dias santos do passado, de quando meu pai e minha mãe eram jovens. E sonhadores.

Sonhar é uma imprudência nos dias atuais. Era também naqueles dias, mas eles não sabiam do que sabemos agora. Não tinham televisão, nem internet. Não usavam e-mail nem Facebook muito menos WhatsApp. Nem podia confundir iogurte com Orkut como o fez recentemente meu padrasto, quando seus netos colocaram uma gravação de celular com ele tentando cantar uma música... Ele me disse, todo feliz: “ponharam eu no iogurte cantando a Petita!” 

Era o Orkut. Ele só tem 77 anos. 

Num noite de setembro, no calor típico da nossa região, os dois, meu pai e minha mãe, se encontraram num baile na “Colônia Preta” e fugiram. Os bailes na roça, em que pese o tom de romantismo das modas de Tonico e Tinoco, serviam bem para o propósito da coisa: abria caminho para as fugas de casais pobres que queriam fugir das festas caras dos casamentos. Eram jovens filhos de trabalhadores rurais que sonhavam escapar do círculo vicioso das colônias casando-se jovens. Assim, fui concebido, com certeza, numa cabana no meio do cafezal, entre sacos de adubo, arados e outros badulaques da roça. Minha mãe nega. Diz que já estava casada quando descobriu que estava grávida. Pode ser que sim; acredito que não. Entre a concepção e a descoberta da gravidez estava o caminho da fuga do baile...

A tática deles deu certo. Casaram e foram morar na cidade, onde o ritmo da vida não era muito diferente daquele da roça. Conta dona Zilda, que nasci nas mãos de uma parteira na “garagem do avião do Geromão”. Era o patrão do meu pai, dono de uma máquina de beneficiar arroz. Segundo, minha mãe, era o único lugar que eles conseguiram para morar e começar a vida. Sendo assim, nasci num hangar. Soubesse disso antes, quem sabe eu tivesse me tornado piloto!

Jocelino Soares me tirou desse passeio nas recordações do passado ao me convidar para tomar um café. Fomos ao Praça Shopping, no café do Zé Antonio, piso da General. Jocelino conhece minhas caipirices porque somos feitos do mesmo barro da roça e me trouxe de presente um punhado de gabirobas. “Comprei um litro lá em Poloni e isso já deu vários punhados que vou levando para os amigos que gostam”, disse ele. Pagou dez reais num litro de gabiroba.

Só um caipira de verdade faria isso, gastar dez contos com gabiroba. O sabor deste fruto cheira a mato, cheira a infância, evoca os sonhos que fomos perdendo ao longo do tempo.

Então agradeci à Imaculada por este dia santo que aqui se tornou feriado por obra e graça do prefeito Manoel Antunes e do vereador José Barbar Cury. Dizem.

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